[Editada por: Marcelo Negreiros]
BRASÍLIA – O procurador-geral da República, Paulo Gonet, apontou a existência de indícios de envolvimento do ministro da Casa Civil, Rui Costa, em crimes praticados na compra de respiradores durante sua gestão como governador da Bahia.
Rui Costa, ministro da Casa Civil do governo Lula, foi governador da Bahia Foto: Wagner Lopes/Casa Civil
Gonet escreveu que o ex-governador “assinou contrato com previsão de pagamento antecipado integral e sem garantias ao ente público”. Por isso, o procurador-geral da República pediu ao ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Flávio Dino, que envie o inquérito sobre esse caso para a retomada das investigações no Superior Tribunal de Justiça (STJ). Procurado, o gabinete de Dino informou que a petição ainda será analisada.
Procurada, a assessoria de Rui Costa afirmou que a manifestação de Gonet “não agrega nenhum elemento acusatório” e disse que não existem fatos que o vinculem a irregularidades no contrato. A assessoria afirmou ainda que a defesa do ex-governador também opinou que o processo deveria tramitar no STJ.
“Cabe destacar que a nova peça da PGR não agrega nenhum elemento acusatório quanto à conduta do então governador da Bahia e que o próprio Ministério Público já tinha manifestado, em parecer emitido no decorrer do processo, que não existe nenhum fato que vincule Rui Costa a qualquer irregularidade na compra dos respiradores”, diz a nota da assessoria do ministro. Ele também já afirmou anteriormente que determinou a abertura de investigação da Polícia Civil após os respiradores não terem sido entregues.
Prejuízo de R$ 48 milhões
A manifestação sigilosa da PGR foi enviada no final de junho ao ministro Flávio Dino. O Estadão teve acesso com exclusividade ao documento apresentado por Gonet. Trata-se da primeira manifestação do atual procurador-geral da República no inquérito.
O caso envolve um prejuízo de R$ 48 milhões na compra de respiradores pulmonares pelo Consórcio Nordeste em 2020, no início da pandemia da covid-19. Na época, Rui Costa era governador da Bahia e presidente do consórcio. Ele assinou um contrato com uma empresa sem capacidade técnica e autorizou o pagamento adiantado, mas os respiradores nunca foram entregues.
A investigação tramitou no STJ quando Rui Costa era governador, mas foi declinada para a primeira instância da Justiça Federal da Bahia após o fim do seu mandato na gestão estadual. Mais recentemente, o caso foi enviado ao STF por causa das mudanças no entendimento do foro privilegiado.
A investigação está parada desde que foi remetida ao STF, em maio deste ano. Por isso, Gonet solicitou a retomada das apurações. “A manifestação é pelo declínio de competência do presente inquérito e das cautelares a ele correlatas para o Superior Tribunal de Justiça, órgão competente para a continuidade das apurações dos fatos que teriam sido praticados no exercício do cargo de governador do Estado da Bahia”, escreveu.
Em sua manifestação, Gonet apontou que existem suspeitas do envolvimento de Rui Costa e outros agentes públicos em crimes envolvendo essa contratação e citou, entre os delitos investigados, o de dispensa irregular de licitação.
“As investigações, iniciadas pela Polícia Civil da Bahia, revelaram indícios de irregularidades na contratação da Hempcare Pharma, empresa com capital social ínfimo, reduzido número de empregados e sem experiência no ramo médico/hospitalar, mas que logrou firmar um contrato milionário com o Consórcio Nordeste”, escreveu.
O procurador-geral da República afirmou que o inquérito apura a participação de agentes públicos nos crimes investigados, citando a possível atuação de Rui Costa. De acordo com a manifestação da PGR, ele “assinou contrato com previsão de pagamento antecipado integral e sem garantias ao ente público”.
Gonet afirmou ao STF que a nova regra estabelecida para o foro privilegiado indica que o caso deveria voltar a tramitar no STJ, porque envolve fatos da época em que Rui Costa era governador da Bahia.
“No presente caso, os fatos investigados ocorreram durante o período em que Rui Costa exercia o cargo de governador do Estado da Bahia. A prerrogativa de foro, portanto, está diretamente vinculada ao cargo ocupado à época dos fatos e à natureza das funções então desempenhadas”, escreveu.
Prosseguiu o procurador-geral da República: “Ainda que o investigado Rui Costa atualmente ocupe o cargo de Ministro de Estado, o novo entendimento firmado pelo plenário do Supremo Tribunal Federal indica que a competência para processar e julgar os crimes que lhe são imputados, por terem sido supostamente praticados no exercício do mandato de governador e em razão dele, permanece no Superior Tribunal de Justiça”.
Delatora diz que pagou ‘comissão’
O inquérito sobre a compra de respiradores foi aberto pela Polícia Civil da Bahia em 2020, mas enviado ao STJ depois que surgiram os primeiros indícios da participação de Rui Costa nos fatos.
Desde então, o caso é investigado pela Polícia Federal, que já deflagrou duas operações para rastrear o caminho do dinheiro desviado.
A dona da empresa Hempcare, Cristiana Taddeo, fechou uma delação premiada e afirmou ter pagado uma “comissão” de R$ 1,6 milhão a um intermediário do governo da Bahia. Segundo ela, esse intermediário, o empresário Cleber Isaac Soares, se apresentou como amigo de Rui Costa e da então primeira-dama Aline Peixoto e disse ter sido o responsável por sugerir a possibilidade de contratação da Hempcare para fornecimento dos respiradores. Ela também admitiu não ter os documentos necessários para obter o contrato, dentre outras irregularidades.
A defesa da empresária não se manifestou. Já a defesa de Cleber Isaac disse que sua inocência será comprovada no processo. “A defesa de Cleber Isaac Soares Ferraz informa que confia na Justiça e acredita que a situação será resolvida em breve. O advogado criminalista Vinícius Assumpção reitera a convicção de que a inocência de Cleber será comprovada ao longo do processo. A defesa destaca que Cleber Isaac já depôes na CPI dos Respiradores da Assembleia do Rio Grande do Norte para esclarecer o assunto e que está colaborando com a Justiça”, afirmou, em nota.
Leia a íntegra da nota divulgada pela assessoria do ministro da Casa Civil
“Na manifestação citada, a Procuradoria Geral da República mostra-se em acordo com a tese apresentada pela defesa de Rui Costa, na medida em que concorda com a manutenção do processo no Superior Tribunal de Justiça. Essa continuidade do foro decorre de decisões e de jurisprudência do Supremo Tribunal Federal, consolidadas anteriormente a esse caso concreto, e colabora com a maior celeridade possível para o andamento do processo, como é desejo manifestado publicamente por Rui Costa e pela sua defesa desde o início.
Cabe destacar que a nova peça da PGR não agrega nenhum elemento acusatório quanto à conduta do então governador da Bahia e que o próprio Ministério Público já tinha manifestado, em parecer emitido no decorrer do processo, que não existe nenhum fato que vincule Rui Costa a qualquer irregularidade na compra dos respiradores”.
[Por: Estadão Conteúdo]
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