[Editada por: Marcelo Negreiros]
As petições do processo na Justiça dos Estados Unidos contra o ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), ocorrem em datas coincidentes a andamentos da ação penal por tentativa de golpe de Estado, relatada pelo magistrado.
Moraes é alvo de uma ação civil na Justiça Federal da Flórida por suposta censura e violação à soberania americana. A queixa foi registrada por Rumble e Trump Media, ligada ao presidente Donald Trump e detentora da rede social Truth Social, em 19 de fevereiro, um dia após a Procuradoria-Geral da República (PGR) finalizar o parecer sobre o inquérito da Polícia Federal (PF) que apurou a trama golpista. A Procuradoria denunciou 34 pessoas ao STF.
Na segunda-feira, 2 de junho, Moraes marcou os interrogatórios dos oito réus do “núcleo crucial” da tentativa de golpe para a segunda seguinte, dia 9. Na sexta-feira, 6, a Trump Media fez um aditamento no processo, apresentando novos argumentos contra Moraes.
Em 14 de julho, as autoras da ação voltaram a acionar a Justiça americana contra Moraes. Nesse dia, encerrava-se o prazo para que a PGR apresentasse as alegações finais contra o núcleo crucial. Horas depois da nova petição na Justiça dos Estados Unidos, a PGR apresentou o parecer e pediu a condenação dos oito réus, incluindo o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL).
Uma petição contra Moraes voltou a coincidir com a ação penal do golpe em 23 de julho. Cinco dias depois de Jair Bolsonaro ser alvo de medidas cautelares, uma entidade sediada na Flórida ingressou como parte interessada no processo (amicus curiae) e pediu sanções contra Moraes e outros ministros do STF nos termos da Lei Magnitsky. O governo Trump puniu Moraes com a norma nesta quarta-feira, 30.
Rumble e Trump Media são representadas pelo advogado Emiliano Martin de Luca. Ao Estadão, o defensor nega o espelhamento de datas. “Não houve nenhuma coincidência – o calendário foi planejado inteiramente por Alexandre de Moraes. A Rumble não escolheu o momento nem o motivo pelo qual recebeu ordens judiciais ilegais em fevereiro”, disse De Luca.
Segundo o representante das empresas, Moraes é “o único responsável pelo timing” das petições. “A Rumble foi apenas alvo e reagiu da única maneira possível: defendendo-se dentro da lei”, completou o advogado.
Procurado, o STF não quis se manifestar.
Alexandre de Moraes, ministro do STF, avaliou que Bolsonaro tentou obstruir o processo criando ‘entraves econômicos’ entre Brasil e Estados Unidos Foto: Wilton Junior/Estadão
Para analistas ouvidos pelo Estadão, a coincidência de datas ocorre de ambos os lados. O jurista Márlon Reis afirma ser “inegável” o desenrolar de uma “disputa simbólica e institucional” entre Brasil e Estados Unidos. “É plausível sustentar que os desdobramentos em território norte-americano estejam sendo, em alguma medida, orientados por interesses políticos e econômicos vinculados à atuação dos Estados Unidos no contexto brasileiro”, disse.
A crise diplomática com os Estados Unidos foi citada nos autos da ação penal da tentativa de golpe. Ao determinar as medidas cautelares contra Bolsonaro, Moraes avaliou que o ex-presidente tentou obstruir o processo criando “entraves econômicos” entre Brasil e Estados Unidos.
O advogado Salem Nasser avalia que a semelhança entre os processos não é acidental ou “mera coincidência”. “A ação parece ter o objetivo principal de ameaçar Alexandre de Moraes com sanções, mas isso não parece estar funcionando”, disse Nasser, doutor em Direito Internacional pela USP e professor da FGV.
Nasser relembra que o espelhamento de datas na Justiça não é estranho ao contexto americano, e o próprio Trump já esteve do outro lado da equação. Nos últimos anos, aliados do republicano queixaram-se de coincidências nos andamentos dos processos contra Hunter Biden, filho do ex-presidente Joe Biden, e contra Donald Trump. Para os aliados de Trump, os processos contra o republicano avançavam em paralelo às acusações contra Hunter.
Por que Moraes é alvo de ação nos EUA?
Rumble e Trump Media pedem que Moraes seja responsabilizado por emitir “ordens secretas de censura extraterritorial”. As autores pedem à juíza do caso que reconheça as ordens de Moraes para a remoção de conteúdo e de contas como inexequíveis em território americano, sob a proteção da Primeira Emenda à Constituição do País, que garante o direito à expressão em termos mais flexíveis que o da legislação brasileira.
O magistrado brasileiro também é alvo de queixa por não ordenar a remoção de conteúdo por meio de cartas rogatórias, tipo de ofício em que se solicita a um tribunal estrangeiro o cumprimento de uma decisão. Nas petições, as autoras dizem que Moraes emitiu “mandados sigilosos de censura para empresas americanas por e-mail, sem notificação e pedindo sigilo para que o governo dos Estados Unidos não fosse informado”.
[Por: Estadão Conteúdo]
Descubra mais sobre
Assine para receber nossas notícias mais recentes por e-mail.