‘Soberania não é manto para impunidade’

[Editado por: Marcelo Negreiros]

Em reação ao evento realizado na última sexta-feira, 25, no Salão Nobre da Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo (USP), um grupo de juristas, advogados, economistas e profissionais de diversas áreas publicou uma carta aberta em que critica o teor da manifestação institucional em defesa da soberania nacional.

O ato promovido na USP reuniu professores, estudantes e entidades da sociedade civil em torno da chamada Carta em Defesa da Soberania Nacional, documento que denuncia suposta “intromissão estrangeira” dos Estados Unidos nas decisões internas do Brasil, em razão de medidas adotadas pelo governo do presidente Donald Trump.

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Durante o evento, foram exibidos cartazes com mensagens como “Brasil, quem te ama não te USA” e “o Brasil não aceita chantagem”. Na ocasião, o diretor da Faculdade de Direito, Celso Fernandes Campilongo, afirmou: “O que está sendo ameaçado não é apenas a soberania do Brasil, é a lei internacional. Hoje é conosco, amanhã com quem?”.

O ato reuniu entidades e pessoas ligadas à esquerda nacional, como José Eduardo Cardozo, ex-ministro da Justiça; Juca Kfouri, jornalista esportivo; José Dirceu, ex-ministro-chefe da Casa Civil; Paulo Teixeira, atual ministro do Desenvolvimento Agrário; e Edinho Silva, presidente do Partido dos Trabalhadores.

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Juristas rebatem fundamentos da carta da USP

A resposta veio por meio de uma carta aberta intitulada Soberania não é manto para impunidade, que contesta os fundamentos jurídicos e políticos da manifestação institucional. O documento foi publicado pela associação Lexum nesta segunda-feira, 28, e conta com mais de 150 signatários.

“Reivindicar soberania é legítimo, mas brandi-la como escudo retórico contra qualquer forma de crítica ou responsabilidade externa é transformar um princípio constitucional em álibi de autossuficiência moral”, diz. Os signatários argumentam que a soberania, em uma república constitucional, “não é sinônimo de imunidade política nem de autoridade moral incondicionada”.

“A soberania que merece respeito internacional é aquela que nasce da fidelidade a princípios universais – liberdade, justiça, igualdade perante a lei – e não da negação deles em nome de um ‘projeto de nação’ tão vago quanto impositivo”, declaram os autores.

A carta também contesta a alegação de que as ações do governo norte-americano constituiriam uma violação direta à soberania brasileira. “Nosso território não foi invadido, nossas autoridades não foram sequestradas por nação estrangeira, e nossos poderes seguem funcionando como bem entendem”, afirmam os autores.

Carta elaborada por associação de juristas conta com assinaturas de Rodrigo Constantino, Flávio Gordon e Helio Beltrão | Foto: Lexum/DivulgaçãoCarta elaborada por associação de juristas conta com assinaturas de Rodrigo Constantino, Flávio Gordon e Helio Beltrão | Foto: Lexum/Divulgação
Carta elaborada por associação de juristas conta com assinaturas de Rodrigo Constantino, Flávio Gordon e Helio Beltrão | Foto: Lexum/Divulgação

Para eles, “sanções econômicas são assuntos pertinentes à política internacional” e devem ser tratadas por via diplomática, não por meio de “bravatas de togados e do seu entorno”, em referência aos ministros do Supremo Tribunal Federal.

Outro ponto abordado é o que os juristas consideram um silêncio seletivo das entidades que subscreveram a carta da USP. “Onde estavam quando o STF instaurou o inquérito sem vítima, sem provocação, sem Ministério Público – o inquérito do fim do mundo?”, perguntam.

A carta menciona ainda casos específicos, como a prisão de Débora Rodrigues por escrever “perdeu, mané” e a morte de Clériston Pereira da Cunha (Clezão) na prisão, para argumentar que houve “violação à legalidade estrita” e que o debate sobre soberania tem servido para desviar o foco de abusos cometidos internamente.

Ao final, os autores argumentam que a verdadeira soberania “é a que reconhece que o poder político deve obediência aos direitos dos indivíduos, e não o contrário”, e concluem: “Se há algo que fere a soberania do Brasil, não é a crítica vinda de fora, é o autoritarismo que brota de dentro – e o silêncio cúmplice de quem só se indigna quando lhe convém”.

Leia também: “A volta dos Irmãos Petralha”, reportagem de Augusto Nunes e Eugenio Goussinsky publicada na Edição 239 da Revista Oeste

[Oeste]

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