[Editada por: Marcelo Negreiros]
A redução das tensões comerciais e políticas entre Estados Unidos e Brasil dependem basicamente da vontade do presidente americano Donald Trump — que em questão de dias, com o tarifaço de 50% (ainda que cheio de exceções) e as sanções contra o ministro
Trump não tem incentivos para reduzir tensões com o Brasil enquanto Lula for presidente, pois tem pouco a perder e muito a ganhar Foto: AP Photo/Alex Brandon EVARISTO SA / AFP
Não há, porém, muitos incentivos para Trump reduzir as tensões com o Brasil. Ele pode até ceder ao lobby de setores empresariais americanos que sofrerão demais com a absurda tarifa de 50% sobre alguns produtos que não entraram na lista de isenções anunciada na semana passada, junto com o decreto confirmando o tarifaço.
Seria uma repetição da tática TACO (sigla em inglês que pode ser traduzida para “Trump Sempre Amarela”), que consiste em elevar demais as exigências e depois voltar atrás. Mas é bom lembrar que, no fim das contas, mesmo com os recuos, as tarifas sempre permanecem mais altas do que eram antes. E com o Brasil o problema é mais embaixo.
Trump vai manter uma relação conflituosa com o Brasil enquanto Lula for presidente, mesmo que em um momento ou outro ele dê sinais de distensão ou aproximação. Isso porque o Brasil é o laboratório perfeito para Trump testar sua capacidade de influenciar na política interna e externa de outro país por meio de dois instrumentos de pressão: a tática mercantilista e o assédio a autoridades.
O Brasil é o laboratório ideal para Trump por dois motivos. Primeiro, porque já existe no País uma narrativa pronta para justificar seus atos de agressão: um presidente de esquerda e instituições que supostamente perseguem um líder político alinhado a Trump. Segundo, porque os possíveis danos para a economia americana de uma escalada comercial com o Brasil são baixos. Os produtos brasileiros representam menos de 2% de tudo o que os Estados Unidos importam.
Já os potenciais ganhos, principalmente políticos, são altos. Primeiro, afastar o Brasil do Brics, enfraquecendo um grupo de países liderado pela China e que vem atraindo a adesão de novos membros, alguns inimigos, outros aliados dos Estados Unidos. Segundo, jogar água no chope do plano do Brics de encontrar uma alternativa ao dólar no comércio externo.
Terceiro, frear as iniciativas do Brasil de regular as grandes empresas de tecnologia digital (muitas das quais são americanas), de forma a desestimular outros países emergentes a fazer o mesmo. Quarto, colocar lenha na fogueira da polarização dentro do Brasil, com o intuito de facilitar o retorno do bolsonarismo ao poder.
Esse objetivo de Trump está implícito em diversas declarações que ele deu sobre Bolsonaro e sobre a política brasileira. Além disso, como demonstra a relação que Trump tem com a Argentina de Javier Milei, o presidente americano está disposto a dar vantagens a governantes que o bajulam e comem na sua mão. A Argentina ficou com a menor tarifa de importação imposta por Trump, dentre todas que entram em vigor no dia 7 de agosto (10%). O Brasil ficou com a mais alta (50%).
Daqui até a eleição presidencial, em outubro do ano que vem, os atritos entre Trump e Lula (direta ou indiretamente, via sanções a autoridades do Judiciário) vão pautar o debate político no Brasil, ainda que a questão tarifária seja superada ou esquecida. A oposição bolsonarista — mesmo aquela ala que diz não concordar com as sanções comerciais de Trump ao Brasil — vai tentar mostrar que é a mais apta a dialogar com o presidente americano. E é possível que ele procure endossar essa ideia. O Brasil tornou-se cobaia das ferramentas trumpistas de manutenção de hegemonia global — e as eleições de 2026 vão fazer parte da experiência.
[Por: Estadão Conteúdo]
Descubra mais sobre
Assine para receber nossas notícias mais recentes por e-mail.