[Editada por: Marcelo Negreiros]
Desde a campanha eleitoral, havia sinais fortes de que a política econômica de Donald Trump seria contraproducente para os próprios Estados Unidos. A combinação de tarifas elevadas com restrições à mão de obra estrangeira, implantada em um ambiente de enorme incerteza política, acabaria aumentando a inflação e reduzindo o crescimento, mesmo com a alta produtividade estrutural da economia americana. As consequências seriam sentidas no mundo todo, inclusive no Brasil. Por isso, tratei desse risco em colunas anteriores.
É hora de voltar ao tema porque os primeiros sinais de que essa hipótese estava correta finalmente começaram a aparecer. O principal indicativo vem da rápida deterioração de seus índices de aprovação, hoje perto de 40%, o pior nível desde o início do segundo mandato.
O desgaste se refletiu também nas eleições locais mais recentes, em que candidatos republicanos perderam terreno em distritos-chave do Meio-Oeste e entre independentes suburbanos — grupo que tem abandonado Trump em peso nos últimos meses.
O sentimento negativo dos eleitores reflete uma economia marcada por desigualdade profunda, que anda a duas velocidades — a chamada economia em “K”. No topo estão famílias ricas e um pequeno grupo de empresas de tecnologia, que continuam acumulando patrimônio e sustentando seus níveis de consumo.
Na base, porém, o quadro é bem mais difícil. Empresas de varejo, como a Target, e redes de fast-food, como a Wendy’s, têm reportado queda de vendas, indicando que consumidores de baixa e média renda estão gastando menos, pressionados por salários que crescem abaixo da inflação.
O problema para Trump é que essa tendência ainda tende a piorar. O impacto das tarifas demorou a aparecer porque empresas americanas absorveram a maior parte do custo até agora — cerca de metade, segundo estimativas recentes. Mas essa estratégia tem prazo de validade. À medida que margens comprimidas precisam ser recuperadas, o repasse para preços ao consumidor vai aumentar. Isso significa que o grosso do impacto inflacionário ainda está por vir.
A situação de Trump se complica ainda mais com o caso Epstein, que voltou ao centro do debate nos EUA após a divulgação de novos documentos e a reabertura de investigações parlamentares. O escândalo colocou aliados importantes na defensiva, gerou desconforto entre republicanos moderados e tem sido explorado pela oposição como exemplo de desordem institucional.
Por tudo isso, este é o pior momento de Trump desde o início do segundo mandato. Para comparar, a popularidade de Lula, no Brasil, hoje está cerca de 8 pontos acima dos níveis de Trump. Nesse contexto, é possível que o lado mais transacional e pragmático do presidente americano ganhe espaço — pelo menos nos temas econômicos.
Trump já aliviou algumas tarifas recentemente para tentar frear a inflação e pode voltar a fazer o mesmo, inclusive em áreas que afetam diretamente o Brasil. Ainda assim, a situação dos republicanos nas eleições legislativas do ano que vem piorou, e o cenário mais provável é que os democratas recuperem o controle de pelo menos uma das casas do Congresso.
Para o Brasil, o principal é entender até que ponto essa piora econômica americana terá efeito apenas sobre a política doméstica dos EUA ou se pode transbordar para um mal-estar mais amplo nos mercados globais. A diferença importa. Por enquanto, estamos no primeiro cenário: o enfraquecimento gradual do dólar tem ajudado o governo Lula, aliviando pressões inflacionárias.
Mas, se o mercado começar a duvidar da solidez do crescimento americano, países emergentes como o Brasil são vulneráveis a movimentos de fuga de risco. Nesse caso, o efeito poderia ser o oposto: dólar mais caro, inflação em alta e um ambiente mais hostil para Lula.
[Por: Estadão Conteúdo]Source link
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