Bombásticas sem pólvora


Acatei a sugestão de um “face” e corri pra banca adquirir o exemplar da
revista semanal. A atração por certa entrevista tomou a mente e guiou-me os
passos. Fui a banca adquiri o exemplar, li com a avidez e o carinho que
naturalmente dedico às publicações em geral e concluí: “Tiro n’água.
Infelizmente, meus amados, é chegado o fim das entrevistas bombásticas.” Não
adianta. Nem Marcelo Rubens Paiva, autor do livro Feliz ano velho, guru de
minha geração e objeto da entrevista consegue ser incendiário nesse quadrante
histórico que atravessamos.
A publicação cumpre seu papel. Ouve a pessoa, edita de alguma forma, põe
na banca e vende. Cumpre, enfim, o seu legado. A opinião contida na entrevista
é que decepciona. Não, é claro, pela categoria do entrevistado. Nada disso.
Rubens Paiva, por exemplo, é um desses casos de pessoas que tem o que dizer. Sua
história de vida (se alguém dessa geração sem ídolos quiser conferir, sugiro
resgatar o livro Feliz Ano velho) e sua militância como escritor e homem de
mídia o qualificam, mas pelo caráter generalista da entrevista. Decepciona, em
suma, por seus direcionamentos, o que parece ser a tônica do mercado editorial
de nossa época. .
Editorialmente, a entrevista se caracteriza por uma série de questões polêmicas
colocadas pontualmente para que o entrevistado destile petardos desmoralizantes.
Lembra ligeiramente uma cena de onça selvagem fustigada por zagaia. Procura-se
desesperadamente quem faça o papel de onça. Difícil, porém, é encontrar a onça
e fazer ela rosnar sem resvalar para um certo grito no vazio. Um misto de
superficialidade com retórica de militante adolescente.
Se perguntarem por que essa impressão se instala fica fácil responder que
talvez isso seja culpa (?) das redes sociais. A multiplicação, a socialização
da opinião esvaziou o poder bombástico das entrevistas. Para disparar obuses
aleatórios qualquer celebridade da última hora cumpre o papel. Zé Migué da
Ramadinha facilmente pode postar no facebuco que Joaquim Barbosa é
“destemperado”, da mesma forma que faz piadas opinativas sobre a opção sexual
de Daniela Mercury. Com um balaio desses é difícil, senão impossível, captar
qualquer opinião que pinte bombástica nas edições de uma revista semanal.
Para ser bombástico hoje o entrevistado tem que ser especialista. Ou
melhor, falar, dar opinião, sobre o campo da qual é mestre. Gosto, por exemplo,
de ouvir poucas e boas sobre literatura, música, política ou diatribes do
judiciário com alguém do ramo, que consiga apontar o dedo para algo ou alguém com
alguma ira e muito conhecimento de causa. Penso que o papel de livre atirador
não cabe mais nas páginas dos impressos.
Se pudermos pensar em democratização da opinião, o mundo caótico das
redes já permite isso. O bombástico está lá, reunindo o intelectual e o Zé
povinho. Só não tem opinião hoje quem é figurante nos humorísticos Globais. O
exercício da opinião que, vez por outra, podia ser contaminada pela
superexposição do besteirol das celebridades foi expandido pela idéia
descentralizadora da rede. O bombástico bóia nas redes sociais com tudo que há
de cáustico e gélido, de gosto duvidoso e de serenidade, de crítico e ingênuo.
Às mídias estabelecidas cabe dar gestação a outro gênero: o das entrevistas incendiárias
analíticas. Nelas o efeito “metralhadora giratória” seria minimizado e quadros
mais efetivos sobre realidades poderiam emergir.
por Edson de
França postado na patosemcena.com.br
        

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